SER GAÚCHO
A tradição e o orgulho que passa de geração a geração
A Semana Farroupilha envolve gaúchos natos e também seus descendentes,
que mesmo fora do Rio Grande do Sul continuam cultuando as tradições e relembrando
seus heróis há mais de 160 anos
Camila Hundertmarck
SÃO MIGUEL DO OESTE
O dia 20 de setembro é um dos dias mais festejados do Sul do País. Pelo
Brasil inteiro estão espalhados milhares de representantes deste povo que
perpetua ano após ano sua tradição e cultura. O povo gaúcho procura relembrar,
através das festividades da Semana Farroupilha, sua história com o
tradicionalismo e o orgulho que carrega por sua cultura e costumes. Em São
Miguel do Oeste não é
diferente. Apesar de não fazer parte do Estado do Rio Grande do Sul, a
população migueloestina, juntamente com os gaúchos que residem aqui, seguem
todo o ano uma série de programações comemorativas ao dia 20 de setembro.
Pelas andanças nos principais pontos de encontro dos
representantes do povo gaúcho em
São Miguel do Oeste não é difícil ver diferentes gerações envolvidas
no universo tradicionalista. São crianças, jovens, adultos e idosos que
participam das festividades da data por se identificar com a identidade desse
povo.
O migueloestino Ernani Werlang participa há oito anos
do Grupo de Cavalarianos do Centro de Tradições Gaúchas Porteira Aberta. Todo o
ano ele faz questão de trazer o filho Guilherme, de 8 anos, para participar das
comemorações. “Sou de São Miguel do Oeste, mas participo porque acho que temos
que nos identificar com alguma cultura. Povo sem cultura não tem identidade”, lembra.
Para ele, o fato de ser migueloestino não o impede de admirar a cultura do
Estado vizinho. “Admiro a cultura gaúcha por que ela fala de honra, de coragem,
de lealdade e, principalmente, de família”, justifica Werlang.
O pequeno Guilherme, vestido conforme manda a tradição
gaúcha, conta que acompanha o pai porque gosta de participar. “Eu venho porque
gosto. E o que eu mais gosto de fazer é andar a cavalo”, conta.
Ana Clara
Ortigara, 13 anos, faz parte da Invernada Artística há um ano e meio e diz que
teve o incentivo dos pais para participar do grupo de danças gauchescas. “Participo
desde pequena, pois sempre tive o incentivo da minha família que admira essa
tradição”, conta. Neta de gaúchos, Ana Clara conta ainda que tem orgulho de fazer
parte da cultura gaúcha. “Quando nos apresentamos, sinto uma emoção e um
orgulho muito forte por poder participar”, diz.
50 ANOS DE HISTÓRIA
A história do tradicionalismo gaúcho na cidade de São
Miguel do Oeste teve início oficialmente em dezembro de 1959. Com mais de 50
anos, o Porteira Aberta foi o primeiro CTG do Estado de Santa Catarina. Naquela
época, Alexandre Tiezerini, Padre Aurélio Canzi e Hipólito Ribeiro conseguiram,
através de doações e investimentos próprios, colocar em pé o primeiro CTG do
Estado.
A formação da arquitetura rústica e
simples do CTG na época foi feita pela própria comunidade, que participou de cada
etapa do processo de construção. “A gente sente orgulho de ter ido atrás e
ajudar. O CTG surgiu com captação de recursos próprios, mas todos colaboravam
de alguma forma”, conta Glaene Hermelinda Tiezerini, filha de Alexandre. Conforme
ela, que é 1ª sota capataz do CTG, cargo semelhante ao de 1ª secretária, o
intuito do pai ao sair da cidade gaúcha de Passo Fundo era vir a São Miguel do
Oeste para fundar um jornal. A idéia não saiu do papel e cedeu espaço para o
projeto e execução de um programa de rádio. “O programa Saudades da Querência é
transmitido até hoje pela Rádio Peperi AM e é o mais antigo programa de rádio com
transmissão ao vivo no Brasil”, conta Glaene.
Hoje, mais de meio século depois, o CTG
dispõe de uma ampla sede. A memória das toras de madeira que lhe deram formato
em 1959 fica reservada apenas para as fotografias guardadas com carinho e
orgulho por aqueles que participaram de sua construção. “A gente sempre quer
que a tradição continue, que ninguém deixe isso morrer. É tão bonito”, exalta
Glaene.
Uma paixão
traduzida em forma de música
É impossível pensar em Rio Grande do Sul sem
lembrar das reuniões dançantes animadas por milongas, chamamés e vaneiras.
Gaiteiros, violeiros, intérpretes e compositores da música tradicionalista gaúcha
traduzem no cantar e tocar a paixão pelo seu Estado.
Miguel Marques é um deles. Com 30 anos de carreira e
17 CD’s lançados, o santiaguense é um dos mais conhecidos cantores e
compositores da música nativista gaúcha. Para ele, não há nada melhor do que
demonstrar em forma de canção, o orgulho que tem de fazer parte da história do
Rio Grande do Sul. “Nas minhas temáticas de composição sempre procuro trabalhar
a simplicidade da vida no campo. São essas coisas simples que me dão entusiasmo
para compor”, conta.
Para Miguel, uma das músicas que melhor descreve o sentimento
de ser gaúcho é a intitulada “Ainda existe um lugar”, composta em parceria com
outro grande tradicionalista gaúcho. “A música é uma das mais pedidas, pois, é
um autorretrato da tranqüilidade da vida no campo”, diz Miguel.
Miguel não se restringe a fazer shows apenas no Rio
Grande do Sul. Conforme ele, as apresentações acontecem em CTG’s e clubes do País
inteiro. Para o tradicionalista, o passar do tempo ajudou a estreitar os laços
de orgulho pela cultura gaúcha. “O sentido de amor pela nossa tradição melhorou
muito. Hoje a juventude voltou a usar bombachas e tomar mate nas praças e isso
é muito importante para manter viva a nossa cultura”, relata.
NO RITMO DA DANÇA
O gaúcho é um dos povos brasileiros que mais cultua
suas tradições. Além da música nativista, o Estado do Rio Grande do Sul possui
inúmeras danças típicas. A vaneira e o chamamé são alguns dos ritmos mais
conhecidos e representados em Centros Tradicionalistas pelo Brasil a fora.
Jeni de Fátima Sebben é coordenadora de Invernada
Artística há 12 anos. Gaúcha de Frederico Westphalen, mora em São Miguel do Oeste há mais
de 30 anos. Além de ensinar os passos dos diversos ritmos da cultura
riograndense, Jeni conta que também trabalha com seus alunos valores de
comportamento e postura. “Exigimos acima de tudo educação, caráter e bom
comportamento”, diz.
Conforme a coordenadora, a indumentária gaúcha, roupa
típica usada por homens, mulheres e crianças, segue o padrão Paixão Côrtes,
desbravador da cultura gaúcha. “Todas as prendas têm uma cor e modelo de
vestido. Assim também funciona com os peões, que usam diferentes cores nas
bombachas, camisas e lenços”, explica. Para ela, ensinar jovens a dançar ritmos
que estão na raiz do tradicionalismo gaúcho é gratificante. “É um sentimento de
amor à Pátria e à tradição gaúcha. É muito bom poder passar isso para as
crianças”, diz.
CULINÁRIA QUE
GANHOU O BRASIL
O Estado do Rio Grande do Sul é conhecido no País
inteiro pela culinária. Tendo como prato principal o churrasco, o gaúcho é um
dos únicos estados brasileiros a disseminar sua culinária por todo o território
nacional. O churrasco e o chimarrão são os principais hábitos entre esse povo e
é difícil achar um deles que não faça essa combinação. O santiaguense Éderson
Galvão Flores que o diga. Nas rodas e reuniões com os amigos, o churrasco é
sempre o cardápio escolhido. “Além de ser muito bom, é gaúcho, é da nossa
terra”, diz.
Por conta da carreira militar, o 3º sargento do Exército
mora há aproximadamente dois anos em São Miguel do Oeste. Porém, não deixou os
costumes de sua terra para trás. Pilchado e com uma adaga na cintura, Galvão
foi eleito pelos colegas para ajudar a assar os costelões em comemoração à
abertura da Semana Farroupilha. Um fogo de chão e alguns pedaços de taquara foram
suficientes para que a festa começasse. “Esse é o verdadeiro modo de fazer
churrasco e surgiu bem no início da nossa história, pela falta de
infra-estrutura dos gaúchos viajantes”, afirma.
Segundo Galvão, o churrasco ficou famoso e chegou às
outras regiões brasileiras por conta das longas viagens que os vaqueiros faziam
por todo País. “O gaúcho é um desbravador. Ele foi levando nossa cultura para
os outros estados quando viajava e assim ela foi se espalhando", finaliza.
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